Trabalho regenerador
Instruções dos Espíritos
REGENERAÇÃO DOS POVOS DO ORIENTE

Recebemos da Síria uma carta muito interessante sobre o estado moral dos povos do Oriente e os meios de cooperar em sua regeneração. A especialidade dessa carta não nos permite publicá-la em nossa Revista; diremos apenas que nosso honrado correspondente, iniciado nos conhecimentos dos povos da Europa,
encara a questão como profundo filósofo, como homem desprendido de todo preconceito de seita, que conhece o terreno e não se ilude quanto às dificuldades apresentadas por semelhante assunto.

Ele vê no Espiritismo, que estudou seriamente, uma potente alavanca para combater os preconceitos que se opõem à emancipação moral e intelectual de seus compatriotas, em razão das próprias idéias que constituem o fundo de suas crenças e às quais seria preciso dar uma direção mais racional. Visando concorrer a essa obra ou, pelo menos, assentar suas primeiras bases, ele concebeu um projeto que houve por bem submeter-nos, pedindo que solicitássemos também a opinião dos Espíritos bons.

A comunicação que nos foi dada a esse respeito é instrutiva para todo o mundo, sobretudo nas circunstâncias atuais, razão por que julgamos dever publicá-la. Ela contém uma sábia apreciação das coisas e conselhos que outros poderão aproveitar na ocasião, e que, os especializando, também encontram a sua aplicação na maneira mais proveitosa de propagar o Espiritismo.

(Paris, 18 de setembro de 1868)

Não só é o Oriente, é a Europa, é o mundo inteiro que uma surda fermentação agita e que a menor casa pode transformar em conflagração universal, quando chegar o momento. Como diz com razão o Sr. X..., é sobre ruínas que edificaram coisas novas, e antes que a grande renovação seja um fato realizado, os trabalhos humanos e a intervenção dos elementos devem acabar de varrer do solo do pensamento os erros do passado. Tudo concorre para essa  obra imensa; a hora da ação aproxima-se rapidamente e deve-se encorajar todas as inteligências que se preparam para a luta. A Humanidade deixa suas fraldas para cingir a veste viril; sacode o jugo secular; o momento não poderia ser mais propício. Mas não se pode dissimular que a tarefa é rude e que mais de um artífice será esmagado pela máquina que tiver posto em movimento, por não ter sabido descobrir o freio capaz de dominar o ímpeto da Humanidade muito bruscamente emancipada.

Ter a razão, a verdade por si, trabalhar visando ao bem geral, sacrificar seu bem-estar particular ao interesse de todos é bom, mas não é suficiente. Não se pode dar de um golpe todas as liberdades a um escravo modelado pelos séculos a um jugo severo. Só gradualmente e medindo a extensão dos limites aos progressos inteligentes e sobretudo morais da Humanidade, é que a regeneração poderá realizar-se. A tempestade que dissipa os miasmas deletérios de que uma região está infectada, é um cataclismo benéfico; mas aquela que rompe todos os diques e que, não obedecendo a nenhum freio, tudo põe em desordem à sua passagem, é deplorável e sem qualquer conseqüência útil. Aumenta as dificuldades, em vez de contribuir para o seu desaparecimento.

Todos os que desejam concorrer utilmente ao trabalho regenerador devem, pois, antes de tudo, preocupar-se com a natureza dos elementos sobre os quais lhes é possível agir, e combinar suas ações em razão do caráter, dos costumes, das crenças daqueles a quem querem transformar. Assim, no Oriente, para atingir o objetivo que perseguem na América e na Europa ocidental todos os espíritos de escol, é preciso seguir uma marcha idêntica quanto ao conjunto, mas essencialmente diferente nos detalhes, isto é, semeando a instrução, desenvolvendo a moralidade, combatendo os abusos consagrados pelo tempo, chegar-se-á a um mesmo resultado, em qualquer parte onde se atue, mas a escolha dos meios, sobretudo, deverá ser determinada pelo gênio particular daqueles a quem se dirigirem.

O espírito de reforma sopra em toda a Ásia; deixou na Síria, na Pérsia, em todos os países circunvizinhos destroços sangrentos; a idéia nova aí germinou, regada pelo sangue dos mártires; é preciso aproveitar o impulso dado às inteligências, mas evitar recair nos erros que provocaram essas perseguições. Não se instrui o homem batendo de frente os seus preconceitos, mas os trabalhando, modificando o mobiliário de seu espírito de maneira tão graduada que ele chegue, por si mesmo, a renunciar aos erros pelos quais pouco antes teria sacrificado a vida. Não se lhe deve dizer: “Isto é mau, aquilo é bom”, mas levá-lo, pelo ensino literário e pelo exemplo, a apreciar cada coisa em seu verdadeiro aspecto. Não se impõe a um povo idéias novas; para que ele as aceite sem perturbação lamentável, é preciso habituá-lo pouco a pouco, fazendo reconhecer suas vantagens e não as estabelecer como princípio senão quando se está certo de que terão em seu favor uma imponente maioria.

Há muito a fazer no Oriente, mas, sozinha, a ação do homem seria impotente para operar uma transformação radical. Os acontecimentos em que tocamos contribuirão por uma parte para essa transformação. Eles habituarão os orientais a um novo gênero de existência; saparão pela base os preconceitos que presidem à legislação da família. Somente depois disto é que o ensinamento lhes virá desferir o último golpe.

Aplaudimos com todas as nossas forças a obra do Sr. X..., o espírito no qual ela é concebida; nós lhe prometemos, além disso, nossa assistência, e o aconselhamos a recorrer a nós, todas as vezes que encontrar algumas dificuldades embaraçosas. Que se apresse em pôr-se à obra; os acontecimentos vão depressa e é difícil que o trabalho esteja terminado quando chegar o momento propício! Que não perca tempo e que conte com o nosso concurso, que lhe é concedido como a todos os que perseguem com desinteresse a realização dos desígnios providenciais.

Clélie Duplantier

A MELHOR PROPAGANDA

(Sociedade de Paris, 23 de outubro de 1868 – Médium: Sr. Nivard)

Se há poucos médiuns esta noite, não é que faltem Espíritos; ao contrário, eles são muito numerosos. Uns são habituais, que vêm instruir-vos ou instruir-se, outros, em grande número, são recém-vindos para vós. Vieram sem carta de entrada, é verdade, mas com o consentimento e o convite dos Espíritos habituais. Muitos desses Espíritos sentem-se felizes por assistir à sessão e o são sobretudo por ver aqui vários espíritas, que eles amam e dirigem, e que tiveram o pensamento de vir entre vós.

Há muitos espíritas no mundo, mas seu grau de instrução sobre a Doutrina está longe de ser suficiente para que se classifiquem entre os espíritas esclarecidos. Sem dúvida têm luzes, mas lhes falta a prática, ou, se praticam, necessitam ser assistidos, a fim de trazer, nos esforços que tentam, mais persuasão e menos entusiasmo. Quando falo de prática do Espiritismo, quero dizer a parte que concerne à propaganda. Pois bem! para essa parte, mais difícil do que se pensa, é preciso, para a exercer com eficácia, estar bem penetrado da filosofia do Espiritismo e também de sua parte moral. A parte moral é fácil de conhecer; para isto exige pouco esforço; em compensação, é a mais difícil de praticar, porque só o exemplo pode fazer bem compreendê-la. Fareis melhor compreender a virtude dando exemplo do que a definindo. Ser virtuoso é fazer compreender e amar a virtude. Nada há a responder àquele que faz o que aconselha os outros a fazer. Assim, para a parte moral do Espiritismo, nenhuma dificuldade na teoria, muita na prática.

A parte filosófica apresenta mais dificuldades para ser compreendida e, por conseguinte, requer mais esforços. Os adeptos que procuram ser militantes, devem pôr-se à obra para bem conhecê-la, pois é a arma com a qual combaterão com mais sucesso. É útil que não se extasiem com os fenômenos materiais e que dêem a sua explicação sem muito desenvolvimento. Devem reservar esses desenvolvimentos para a análise dos fatos de ordem inteligente, sem, contudo, dizer muito, pois não se deve fatigar o espírito das pessoas noviças no Espiritismo. Explicações concisas, exemplos bem escolhidos, adaptando-se bem à questão que se discute, eis tudo o que é preciso. Mas, repito, para ser conciso, não se deve saber menos; para dar exemplos ou explicações bem apropriados ao assunto é necessário conhecer a fundo a filosofia do Espiritismo. Esta filosofia está resumida em O Livro dos Espíritos, e o lado prático em O Livro dos Médiuns. Se conhecerdes bem a substância dessas duas obras, que são obra dos Espíritos, certamente tereis a felicidade de trazer muitos dos vossos irmãos a essa crença tão consoladora, e muitos dos que crêem serão postos no verdadeiro terreno: o do amor e da caridade.

Assim, pois, meus amigos, aqueles dentre vós que desejarem, e todos devem desejar, fazer seus irmãos partilharem de suas crenças, que os querem chamar ao banquete de consolação que o Espiritismo oferece a todos os seus filhos, devem
moralmente praticar o Espiritismo praticando a sua moral, e intelectualmente espalhando em seu redor as luzes que colheram ou que colherão nas comunicações dos Espíritos.

Tudo isto é fácil, basta querer. Pois bem! meus caros amigos, em nome de vossa felicidade, de vossa tranqüilidade, em nome da união e da caridade, eu vos exorto a querer.

Um Espírito

O VERDADEIRO RECOLHIMENTO

(Sociedade de Paris, 16 de outubro de 1868 – Médium: Sr. Bertrand)

Se pudésseis ver o recolhimento dos Espíritos de todas as ordens que assistem às vossas sessões, durante a leitura de vossas preces, não só ficaríeis tocados, mas envergonhados de ver que o vosso recolhimento, que apenas qualifico de silêncio, está bem longe de aproximar-se do dos Espíritos, um bom número dos quais vos são inferiores. O que chamais vos recolherdes durante a leitura de vossas belas preces, é observar um silêncio que ninguém perturba; mas se os vossos lábios não se mexem, se o vosso corpo está imóvel, vosso Espírito vagueia e deixa de lado as sublimes palavras que deveríeis pronunciar do mais profundo do vosso coração, a elas vos assimilando pelo pensamento.

Vossa matéria observa o silêncio; certamente, dizer o contrário, seria vos injuriar; mas o vosso Espírito tagarela não o observa e perturba, neste instante, por vossos pensamentos diversos, o recolhimento dos Espíritos que vos rodeiam. Ah! se os vísseis prosternados diante do Eterno, pedindo a realização de cada uma das palavras que ledes, vossa alma ficaria comovida e, lamentando sua pouca atenção passada, faria um exame de consciência e pediria a Deus, de todo coração, a realização dessas mesmas palavras, que apenas pronunciava com os lábios. Pediríeis aos Espíritos que vos tornasse dóceis aos seus conselhos; e eu, Espírito que vos falo, após a leitura de vossas preces, e das palavras que acabo de repetir, poderia assinalar mais de um que daqui sairá muito pouco dócil aos conselhos que acabo de dar e com sentimentos muito pouco caridosos para com o próximo.

Talvez eu seja um pouco duro; mas creio não o ser senão para os que o merecem, e cujos mais secretos pensamentos não podem ser ocultos aos Espíritos. Assim, só me dirijo aos que aqui vêm pensando em qualquer outra coisa senão nas lições que aqui devem buscar e nos sentimentos que aqui devem trazer. Mas os que oram do fundo da alma orarão também, após a leitura de minha comunicação, por aqueles que vêm aqui e daqui partem sem terem orado.

Seja como for, peço aos que tiverem a bondade de me escutar, que continuem a pôr em prática os ensinamentos e os conselhos dos Espíritos; a isto vos convido no seu interesse, pois não sabem tudo o que podem perder não o fazendo.

De Courson

R.E. , novembro de 1868, p. 472